segunda-feira, dezembro 02, 2013

quarta-feira, novembro 27, 2013

Contigo aprendi a confiar menos.
Nos outros.
Mas foi também contigo que aprendi. A confiar.
Tudo. Em. Mim.

A amar-me. Portanto!

É. Foi bom. Viveste.
Vives|te-me.
Mas ainda bem que já morreste-me.

quinta-feira, novembro 21, 2013


Às vezes a aorta entra em decadência intelectual.
Oh Maravilha.
De juízos de valores estandardizados
As sensações não se regem de faces pálidas.
De peixes amórficos. De botelhas entulhadas numa qualquer varanda.
As sensações, essas são como os gargalos.
De beiços em bico. Sedentos. De gargantas.
Que vos chamem de vadios. Que se fodam.

 

sexta-feira, novembro 08, 2013


Margarida Rebelo Pinto,

Houve uma vez, aqui há uns anos, alguém vira-se para mim, e diz que sou uma ignorante porque nunca ter lido um livro seu. Afirmou ainda, que mulher para ser mulher, tinha que ler os seus livros.
Note-se porém, que a trato por você, não como sinal de respeito, mas de distância. Porque de si e de mulheres como a senhora, quero é distância.
Nunca li um livro seu. E veja lá você bem, que sou uma mulher inteira. Não é fantástico?
Mas sabe o que é ainda mais fantástico? O seu humor.
Gosto tanto. Então quando a senhora chamou a todos nós portugueses de… treinadores de bancada. Ri-me a valer.
É. Realmente a senhora é uma humorista nata.
Já pensou em ir brincar aos pobrezinhos para a Comporta? Pense lá nisso. E se possível vá a banhos. E já agora à pesca.
É que mulheres como a senhora, não devem saber nadar e muito menos pescar.
Pessoas como a senhora, gostam de comprar o peixe no supermercado. Nem se dão ao trabalho de ir ao mercado e muito menos sabem o que é uma lota. Pessoas como a senhora, não sabem o que é pescar. E ainda têm a lata de dizer e mais, o atrevimento de vir ensinar a pescar.
Tenha juízo. Pegue em si, vá ao Ikea, compre um banco. Pegue nele e vá até às Berlengas ser treinadora de gaivotas.
Tivesse eu idade para ser sua mãe, e dava-lhe uma valente bofetada nessa cara.
E desculpe senão entendeu a metáfora da pesca, é que tal como a senhora diz... nós portugueses devemos muito à inteligência.

Cumprimentos,
A mulher que nunca leu Margarida Rebelo Pinto

segunda-feira, novembro 04, 2013


Escada de tábuas.
Não. Era granito. O corrimão, sim. Era de madeira.
Colaterais. Glaciais. Austeros. Degrau. Um. Degrau. Três. Degrau. Cinco.
E enquanto subia. Nos ímpares. Que eram os dias. Mirava pelo ombro.
Não pela quina da retina. Por cima. Do. Ombro. De alça fina. Comedida. Centrada.
E é assim que se governa uma alma. Focada nos dias pares. Distraída nos dias ímpares. Porque são assim as distracções. Reles. De tão boas que são.
A escada toma forma. A nossa. A tua. A minha. Alma. Densa. Sem corrimão. De braços abertos. Espreguiçados. Escada acima.
E entre andares. Dança.
Despe-te se for preciso. Vá. Dança, porra!
É dever dos arquitectos fazerem alpendres para dançares. Dança. Dança contigo. Espreguiça-te à vontade. Para lá das assimptotas.
Arrebenta com cada osso. Vá. Foda-se. Arrebenta com todos os ossos.
Deixa ficar só a Alma. No alpendre a dançar. Sem música. Sem nada. A. Nu.
Eu disse a nu.
Despe-te. A dança é tua. Que se foda se estão a ver.
Corre. Corre. Corre. Atrás de ti mesmo.
Deixa a roupa. Ficou lá atrás. Continua a correr. Sente cada osso.
Ainda sentes os ossos? Eu disse-te para rebentares com todos.
Continua a correr. Sente a sola do pé. É pó. É alcatrão. É calçada.
Pára. Pára agora!
E dança outra vez. Que importa se é ré sustenido ou si bemol. Não há música.
És só tu.
E o alpendre.
E é tão bom não é?

E é assim que se governa uma alma. Focada nos dias pares. Distraída nos dias ímpares. Porque são assim as distracções. Reles.
De tão boas que são.

terça-feira, outubro 15, 2013

Lamentavelmente não tenho saudades tuas.
O que é lamentável para ti.
Agora coloca esta frase no pretérito imperfeito.
E terás o meu sorriso rematado.

terça-feira, agosto 13, 2013

Seja por oxigénio. Por aquela pedra da calçada. E aquela viagem que nunca fizeste. Por aquele vizinho que assobia à janela. Pelo teu irmão. Pelo trabalho. O oceano. A areia que não foi parar à duna. O caminho que parece não ter canada certa.... Aquela bebida ao fim do dia. O entardecer do deserto. O amanhecer na ilha. E aquele abraço sem agenda. Um quadro. Uma lágrima pela tela abaixo, deixa que escorra pela parede. É tua. Apaixona-te. Mas apaixona-te a sério. Como se querem as paixões. Inteiras. Com o coração todo. E segue. Segue. Segue. Seja o que for, se te faz sorrir, não é pecado. E se for, que seja. Há pecados tão bons, é ou não é? Ah pois é! Segue. Segue-o sempre. Porque ele é teu. Só teu. Teu. Teu. Teu. Até ao limiar de cada célula. De cada veia. De cada batimento. Segue-o. Pára. Ouve. E depois segue. Segue como se não houvesse amanhã. Dança ao som de cada pulsação. Abana a anca. E Segue-o. E ri. Mas ri a bom gargalhar, às vezes ele precisa disso. Distrai-TE. Mas não percas o autocarro!
 
 

domingo, agosto 04, 2013

Às vezes temos sonhos. E ninguém acredita neles.
É como ir à Lua. Era absurdo, e foram.
Gosto muito quando são absurdos. Gosto tanto!
Só os cobardes acham os sonhos absurdos.
Se os tens. Sonha.
E se os tens com eles bem no sítio. Então. Acredita e Faz !

quarta-feira, julho 17, 2013

Hannah




Não gosto de me guiar por mapas.
Nem por agendas. Nem ponteiros. Tic tac’s só no miocárdio.
Também não gosto de gestos previamente ensaiados. Arquitectados.
Gosto de impulsos.
Do imprevisto. O que eu gosto do imprevisto. Junto com impulsos.... Gosto tanto.
Foi num desses impulsos do imprevisto, ou ao contrário também dá, que conheci Hannah.
Senhora de um quê de dissemelhante. Sentada num banco de madeira, lia o jornal sobe os graus negativos que se faziam sentir. Retina grande. Antiga actriz de teatro dos anos 60.
Nos sapatos de sola fina, a imagem da maschera nobile. Curiosos aqueles sapatos. Como curioso era tudo em Hannah.
Chamou-me para dentro da sua loja. Trajes e mais trajes do outro século e ainda do outro. Parecia que estava dentro duma máquina do tempo. Sublime, verdadeiramente sublime aquela loja no meio daquele beco perdido com aquela senhora de conversa agradável.
Conversamos sobre a Grécia antiga, sobre filosofia e também sobre sentimentos.
Curiosa esta vida de pessoas qua ainda vão tendo a coragem de serem diferentes, de terem aquele charme tão eloquente do que é intenso e bonito.
Hannah conhece Lisboa, e o que mais gostou foi da ladra, que se diz feira. E da vista. E do Tejo. E do mar.
Combinamos a ausência de informática para a troca de partilha do clicar. Este segue por carta, assim como uma concha, deste mar que é tão nosso.
Hannah foi de um enorme prazer conversar contigo e partilhar um pouco da minha estranheza.
E é por isto e por outras tantas coisas, que uma pessoa mesmo que viaje sozinha, nunca está sozinha. Existem pessoas fantásticas em cada esquina.
À nossa espera.
No imprevisto.
E eu gosto tanto disso.
Improvisa

[Na ardósia | https://www.facebook.com/numarua | uma citação de Rumi, filósofo preferido de Hannah | Amesterdão ]

quinta-feira, julho 11, 2013

Pisca Pisca


De vez em quando, há que dizer: Que se f*da. Ou para os mais tímidos que se lixe.
Que se lixe, dá liberdade.
A liberdade. Insanidade.

E às vezes. Tão meticulosamente. Às vezes. É o que basta.

Insanidade. Bem ou mal, tudo o que vale realmente a pena. Tem aquele doce e salgado toque de insanidade. Há quem chame de sensualidade, atreve-te. E pisca o olho à vida ;)


Ou já morreste?

segunda-feira, julho 08, 2013

Eleições


Já era de noite em São João dos Angolares, na costa leste da ilha de São Tomé, distrito de Caué.
Noite cerrada, quase sem lusco-fusco. Eu vinha do lado da capital, Cristopher do interior, da mata, esteve todo o dia a fotografar insectos, e nem se apercebeu que naquele domingo tinha sido as eleições. Mas sobre Cristopher, filósofo Holandês, partilho noutra altura.
As eleições em África é qualquer coisa de não descritível. É ir lá. E ver. Os cidadãos são premiados com dinheiro... ou até motos, pelo voto. E quando vão votar levam um carimbo na mão, para que os apoiantes dos partidos saibam que aquela pessoa já votou e assim fazerem o que têm a fazer das piores maneiras.
É impressionante o quanto o iletrismo, é um factor importante para estes políticos, já dizia não sei quem, que o pior inimigo de um político é a sabedoria do povo. Fora da capital reina o iletrismo e todas as más consequências deste.
À medida que fui descendo aquela canada cor da terra que só África sabe ter… várias crianças vieram ao meu encontro, só queriam um abraço, um colo. É. Só queriam um colo. Passei o centro da vila com onze crianças. Uma em cada dedo da minha mão, e ainda uma outra agarrada à minha cintura. É provavelmente uma das melhores imagens e sentimentos que tenho das minhas viagens, e também, das minhas memórias. Porque são daqueles sentimentos que não se descrevem. Não há adjectivos. Léxico que chegue. Sente-se. E pronto. E basta.
Quando paramos na praça, um homem dos seus trinta anos, encostou uma arma à minha cintura e diz: “Só passas desta praça com vida, porque estás com as nossas crianças. Uma branca, sozinha aqui em dia de eleições. Ou não sabes o que se passa, ou estás a armar-te em valente.”
Eu sabia exactamente o que se passava. Mas arrisquei. Confesso, quando senti o cano da arma na cintura, tremi. Suei. Mas sorri e só disse. Estou na paz, só vim dar uns quantos abraços às crianças. Ele retirou a arma da minha cintura, colocou-a em cima do ombro e disse, tens uma hora para sair daqui. E eu tive mais um dia. Quem me deu almoço no dia seguinte? A família desse homem. A vida tem coisas fantásticas. Não tem?

[ No clicar, algumas das onze crianças]



segunda-feira, julho 01, 2013

Disse

Aproxima-te.

Foi o que ele disse. Encostado ao armário de madeira. Pernas cruzadas, o corpo virado para leste. Dizia que era como as corujas. Sempre pousadas para Leste. Onde há iluminação. E sim, disse ele. E lá ao fundo da sala. No canto leste. Aquele canto, o mesmo que tantos silêncios já ouviu. Partilhados. Fundos.

Aproxima-te.
E ela na poltrona. Encostada ao manto vermelho. Ligas pretas, o corpo virado para Norte. Dizia que era como as serpentes. De nortadas. Ousadas. Onde há talvez a escuridão. E sim, disse ela. E lá do outro lado da sala. Do canto Norte. Aquele canto, o mesmo que tantos gemidos já ouviu. Partilhados. Fundos.

Eu disse, aproxima-te. Não ouviste?
Cruzou os braços. Acendeu um cigarro. Tirou os olhos do chão, olhou a poltrona. E ela de costas. No vermelho. Do pecado. O corpo apenas com aquelas ligas pretas.

Entre luz de Outono. Da janela do canto sul. Fim de tarde. De dourados.

Aproxima-te.
Disse ela. Descruzando as pernas. Aliviando a liga.
Tocava um piano. Lá fora. Tinha cauda. Sem músico. De pautas.

Tocou-lhe na face.
E não se aproximou. Disse ele.
Com ela.

quarta-feira, junho 19, 2013

Números

Senhor Ministro Crato

Sou muito sincera… pouco ou nada percebo de política, mas uma coisa sei, o senhor e todo o seu ministério, colocam dia após dia, em causa o amor e o respeito que alguns professores têm pela profissão.

... Em nenhum dos seus discursos oiço, que é preciso acreditar na inovação, nos professores, nos alunos e no ensino enquanto veículo de crescimento pessoal, intelectual e humano.
Desculpe, mas o que o senhor está a fazer não é inovação, é parvoíce. A roçar a desumanidade.

Todos somos humanos, todos devemos um terno e eterno respeito, pelo que nos rodeia. E assim como temos devemos respeito, também o merecemos. Nunca em nenhum dos seus discursos, ouvi a palavra amor. Ou acha que com nove anos de ensino senão fosse por amor que continuava? O seu motorista ganha muito mais que eu, tenha juízo. E já agora senão for pedir muito… tenha coração.

O senhor é matemático. Mas também é estatístico. Sabe, houve uma vez que ouvi um grande matemático da nossa praça, afirmar que a estatística não é considerada matemática. Concordo. Porque a matemática é bonita… e o senhor só quer saber de estatísticas… de teorias probabilísticas….de.. algumas incertezas para que alguns pensem que você é a própria certeza.
Num dia destes, vi-o. Tinha um ar altivo, olhar vazio, sempre de mãos fechadas. Não fosse eu saber que o senhor era o senhor, e nunca diria que você é professor.
Oh... desculpe. Afinal era mesmo você. O politico.
Espero de coração, que num destes entardeceres, abra as mãos, sinta humildade... e encha a retina.
É que eu se estiver de ar altivo, olhar vazio e mãos fechadas... afecto mais de uma centena de alunos... você afecta milhares deles.
E nem que afectasse apenas um. Esse ‘um’ não é um número. É um ser humano.

Cumprimentos
Estranha Pessoa Esta

sábado, maio 25, 2013

Convite

Houve uma vez que casei-me.
Fiz convites. Convidei a malta e foi um tal churrasco a tarde toda. Até prendas recebi. Calçava ténis.
Hoje descalça. Pensei. Porque raio é que a malta atura aqueles estupores que vão para os funerais chorar e aiii e tal e coiso que era tão boa pessoa. E depois vai-se a ver parava na mercearia da esquina a falar do dito cujo que era isto e aquilo e o mais que fosse. Mas...
hoje? Ahhhh hoje que morreu, já era tão boa pessoa.
Pois eu quero que esses choros insípidos todos se f*dam. Como tal, no meu funeral só vai quem me apetecer.

E se de repente aparecer na tua caixa de correio um convite para um funeral. Não estranhes. Foi a estranha que faleceu. Sorri. É sinal que tens tomates.

Obs.: Aparece descalço.

sexta-feira, maio 17, 2013

Linha



No próximo apeadeiro deita a mala fora. Não esperes pela estação, ela pode não chegar.
Tira a gravata. Tira tudo. Tudo o que te sufoca. Que te prende. Que não te abrace.
Tira. Fica a nu. Completamente a nu. Sem medos. Eriça-te.
Abate o que...
te estrangula. Tau. Mata isso. Enterra e faz cócó em cima.
Caga de alto para as recordações menos boas. Ou então pega nelas apenas
solidificar a tua ‘coluna’ e dares valor… aquele valor... ao que merece realmente a pena.
Aquelas recordações, mala cheia de autocolantes, sítios, pessoas, passagens, ora metade cheio, ora metade vazio. Se tinhas uma destas com um cinto castanho, e apertavas o cinto conforme as sensações, e um dia apertaste tanto tanto mas, tanto… que esqueces-te de sentir, guardavas tudo e no fim não vivias nada. Hoje, sim hoje orienta-te e fica sem mala. Arranja antes um bolso… Eu cá gosto de bolsos, daqueles pequenos como eu… guardo o necessário para respirar..
E o resto dou ao vento..
Saio na próxima estação.
Gosto de estações… as malas grandes só servem para apeadeiros.

terça-feira, maio 14, 2013

Manda a vida à real merda

Manda a vida à merda. Como se manda no teatro. Manda a vida à merda, como quem corre desenfreadamente pela rua à procura de uma qualquer taberna aberta para arreares daquilo que estás à rasca. Manda realmente a vida à merda. De joelhos serrados contra a parede de um qualquer cais do Sodré. Mas é que manda mesmo. A vida. À real merda. Antes que ela te mande a ti.
Bate a porta. Estende o tapete. Dei...ta-te nele e a seguir levanta-te. Olha-a nos olhos, essa puta que finamente se diz prostituta. A vida. Encara. Vá, porra. Não ouviste. Encara-a. Puxa-a por um braço, encosta-a contra a parede e manda-a à merda.
E a seguir até podes morrer. Mas deixa-te de ‘paneleirices’, e estendidelas no sofá. Levanta-te e renasce. Ou nasce. Ou inventa-te. E a seguir, bebe uma cachaça se preferires. Bate com o copo. No balcão, na calçada quero lá saber. Desde que a mandes à merda. Mas manda.
A valer. Não vale meias medidas, contidas. Tímidas espreguiçadelas. Quem tem medo compra um cão. E quem não tem manda a vida à merda.
Porque só depois disso. Dessa real gana orgástica, se pode viver. Até lá caga. Mas caga bem. Na morte do insípido. Dos quase tudo e assins assins.
Que raio é isso do assim assim?
Ou é ou não é, agora cá merdas.

domingo, maio 05, 2013



Há quem diga que o certo, é o usual.
Meus amigos, permitem-me discordar.
Não sei se é certo… mas, que o inesperado é bom!
Lá isso é!
Se é certo ou errado… eu não sei!
Mas, na próxima vez que cruzares comigo na rua.
Faz-te Rua!
Que é como quem diz.. faz-te inesperado!
É que eu cá gosto, é das coisas erradas…
Nada usuais, portanto!
‘Inespera’!
… Que é só assim, que me vais fazer nada usual…
E eu sei, que também não gostas das coisas banais..
Faz-te Rua!

Aqui para nós… andas um pouco banal, não andas?

É que eu ‘conheço-te’ errado…
Faz-te um favor, e Apalpa-me os Sentidos!

domingo, abril 07, 2013

Sacrista

Sacrista.
Era assim que o meu avô me chamava quando eu fazia perguntas… daquelas.
Quando eu estou assim, sem saber se sigo para bombordo ou para estibordo. Sento-me junto do oceano, e tento sentir essas nossas conversas.
Houve uma vez numa corrida entre o Baleal e Peniche, em que páramos para descansar à beira-mar, daquelas marés baixas que deixam todo o areal a descoberto.
Entre um sorriso e um ...
olhar, disse-me:
Sacrista, quando não souberes para onde seguir, quando não souberes se deves correr devagar ou de pressa, ou de parar. Quando não souberes se é certo ou é errado. Chora. Mas chora tudo, e depois levantas-te e sente o teu coração. Na dúvida escolhe o risco, a vida não tem graça apenas com certezas. Na dúvida entre a cabeça e o coração, escolhe sempre o coração. Porque depois mais tarde, quando parares. Podes desculpar-te tudo a ti mesma, menos o que não fizeste com medo de ser errado. A tua cabeça pode desculpar-te, mas o teu coração não. E tu, o que tu és, o que é uma pessoa é coração.
Hoje. Sentei-me na maré. Fechei os olhos, senti o sal. E decidi. O coração.
E aposto, que o meu avó, fez aquele sorriso de esguelha e disse…. Sacrista… Sacrista… tu não escolheste o mais fácil.
E aposto que ele ouviu-me a responder…. E quem disse que o coração era fácil? Por isso é que vale a pena, não é ‘vô?

terça-feira, fevereiro 26, 2013

domingo, fevereiro 24, 2013

Esperança



Estava cansada. Naquele dia não tinha conseguido boleia, estava no interior da ilha e queria chegar antes de anoitecer à capital. Depois de uma longa caminhada, cheguei à cidade pelo entardecer. Deambulava pela marginal, sentia aquele por de sol…. Aquele que só África sabe ter.
Zezito estava sentado sobre uma embarcação. De pernas cruzadas, olhar no horizonte. À sua direita a irmã. Na areia dois amigos, faziam malabarismos e sobre o areal. Pinos e mais pinos. Sentei-me perto... do Zezito. Perguntou-me o que eu fazia ali sozinha. Disse-lhe que tentava respirar. Sorrir. Viver.
Zezito tem dez anos, mas um discurso coerente, pausado. A mãe, Esmeralda, vende tecidos no largo do mercado. Se viermos de norte, fica do lado esquerdo, no muro perpendicular ao mercado.
Pergunto-lhe do país, do seu país… o que ele gostaria de mudar. Zezito responde, a escola. Uma escola para todos e não apenas para os que são amigos dos políticos. Foram as suas palavras. Assim. A seco.
Depois da escola e em muitos dias, na hora da escola. Zezito pega num carrinho de fazer pipocas e vai vender para o tal largo do mercado.
Sempre que falava comigo, não descuidava dos movimentos da irmã. Chamando quando a menina ia para a beira da estrada, ou se tentava ir para o mar. Diz-me que é assim, que ele tem que cuidar da irmã, porque a mãe é meio… descuidada e que às vezes esquecia-se um bocadinho deles.
Zezito pergunta-me o que tenho dentro da mochila, digo-lhe que tenho alguma roupa, uma ardósia e uma máquina de tirar fotografias.
Gostava de escrever uma mensagem para Portugal na tua ardósia, deixas-me? E eu deixei.
“Pai eu quero que você venha a S.T. por favor eu quero te conhecer e você quando me conhecer vai ficar feliz. Tu és bem vindo a S.T.” Zezito Frota
Aquando a gravidez de Esmeralda, o pai de Zézito rumou a Portugal. Quando conheci o Zézito estas foram as suas palavras: "Filipa quando fores a Portugal, olhas para todos os homens e o que tiver a minha cara é o meu pai, e o que tiver a minha cara é o meu pai, e mostras esta fotografia." E num sorriso ainda diz "Quando ele me conhecer vai ser feliz".
Pelo bonito ser humano que Zezito é, merecia mais que um grande abraço meu. Convidei-o para almoçar no outro dia. Zezito aceitou mas com uma condição, que o almoço tinha que ser também para a irmã.
Digo-lhe que tenho pouco dinheiro, expliquei-lhe que não consigo levantar dinheiro no país, que só existe uma caixa multibanco no hotel grande da cidade, e que estes não me deixaram entrar.
Zézito diz que não quer que eu gaste dinheiro com eles. Explico-lhe que faço todo o gosto em levar-lhe a um restaurante, a ele e à sua mana. Zezito sugeriu que pedíssemos apenas um prato e que dividíssemos a comida por nós três.
No outro dia, a meio da manhã encontrei o Zezito no mesmo sítio, na mesma embarcação. Tornou-me a lembrar para não me esquecer da fotografia, e do pai. E que gostava que o pai fosse feliz.
Zezito, és tão grande meu amigo. Tão grande, e às vezes nós somos tão pequeninos. Como pequeninos foram as pessoas que estavam no restaurante. Não queriam o Zezito e a mana no restaurante. Porque estavam sujos, e porque não sabiam comer com talheres. Respondi-lhes qual era a diferença entre mim e as crianças. Visto eu nesse dia, ter dormido na rua, não ter tomado banho, e que se me apetecesse comer com as mãos, comia. Lá cederam. O Zezito não queria entrar, quase a chorar disse-me que não queria que eu ralhasse com as pessoas por causa deles.
Expliquei-lhe que às vezes uma pessoa tem que ralhar com as outras, para as outras relembrarem que somos todos iguais. Todos com o sangue vermelho e um coração.
Foi mais difícil de convencer Zezito a entrar no restaurante do que convencer as pessoas que o Zezito e a irmã tinham todo o direito de estar ali.
Zezito nunca tinha ido a um restaurante.
Sentou-se. Levantou-se de seguida, pegou a irmã pela mão, e dirigiu-se à casa de banho. Esteve largos minutos a lavar a cara e as mãos. Dele e da irmã.
Pedimos carne grelhada. Arroz e batatas fritas. Dividi por nós os três. Disse-lhes que podiam comer à mão, ou se quisessem eu ensinava-os a comer de talheres. Mas o frango meus amigos, sabe mesmo bem é mão. Seja na Europa, em África, em casa ou num restaurante.
Antes de comer, Zezito pegou nas nossas mãos e pediu-me se podia fazer uma oração. Acenei que sim: “Deus obrigada por esta comida, e pela Filipa.” E eu, confesso que chorei. Com o coração todo.
Obrigada eu, Zezito. Por existires. Por seres quem és. Por teres esse coração do tamanho deste e do outro mundo.
Partilhem a fotografia do Zezito. Façam-na correr este mundo e o outro.
O sonho desta criança é conhecer o pai que nunca viu.
E num sorriso ainda diz: "Quando ele me conhecer vai ser feliz".
O impossível às vezes acontece.
E quando acontece, é tão bonito.


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Hoje, 27 de Novembro de 2016 reli esta partilha.  E chorei. Contigo.

segunda-feira, fevereiro 11, 2013

Abraço|s


Já era de noite em  São João dos Angolares, na costa leste da ilha de São Tomé, distrito de Caué.

Noite cerrada, quase sem lusco-fusco. Eu vinha do lado da capital, Cristopher do interior, da mata, esteve todo o dia a fotografar insectos, e nem se apercebeu que naquele domingo tinha sido as eleições. Mas sobre Cristopher, filósofo Holandês, partilho noutra altura.

As eleições em África é qualquer coisa de não descritível. É ir lá. E ver. Os cidadãos são premiados com dinheiro ou até motos, pelo voto. E quando vão votar levam um carimbo na mão, para que os apoiantes dos partidos saibam que aquela pessoa já votou e assim fazerem o que têm a fazer das piores maneiras.

É impressionante o quanto o iletrismo, é um factor importante para estes políticos, já dizia não sei quem, que o pior inimigo de um político é a sabedoria do povo. Fora da capital reina o iletrismo e todas as más consequências deste.

À medida que fui descendo aquela canada cor da terra que só África sabe ter… várias crianças vieram ao meu encontro, só queriam um abraço, um colo. É. Só queriam um colo. Passei o centro da vila com onze crianças. Uma em cada dedo da minha mão, e ainda uma outra agarrada à minha cintura. É provavelmente uma das melhores imagens e sentimentos que tenho das minhas viagens, e também, das minhas memórias. Porque são daqueles sentimentos que não se descrevem. Não há adjectivos. Léxico que chegue. Sente-se. E pronto. E basta.

Quando paramos na praça, um homem dos seus trinta anos, encostou uma arma à minha cintura e diz: “Só passas desta praça com vida, porque estás com as nossas crianças. Uma branca, sozinha aqui em dia de eleições. Ou não sabes o que se passa, ou estás a armar-te em valente.”

Eu sabia exactamente o que se passava. Mas arrisquei. Confesso, quando senti o cano da arma na cintura, tremi. Suei. Mas sorri e só disse. Estou na paz, só vim dar uns quantos abraços às crianças. Ele retirou a arma da minha cintura, colocou-a em cima do ombro e disse, tens uma hora para sair daqui. E eu tive mais um dia. Quem me deu almoço no dia seguinte? A família desse homem. A vida tem coisas fantásticas. Não tem?

[ No clicar, algumas das onze crianças]

[Mãe, se leste este post, desculpa qualquer coisa, mas eu gosto é de viver assim]

terça-feira, janeiro 29, 2013

Senhores Doutores



Carta a todos os fidalgos que mandam e mandaram, e que de certa forma continuam a mandar, nesta vossa, que deveria ser nossa nação.

Caríssimos,

Falemos de recordações, falemos da infância. O meu avó tinha a segunda classe, se tanto. Descascava pêssegos como ninguém. No verão, após o almoço, ia até ao pomar e trazia-me o melhor pêssego da árvore, pegava na navalha que religiosamente colocava todos os dias no bolso das calças, no outro bolso tinha um lenço, daqueles de caris...ma. Do tempo.
E enquanto descascava o pêssego, contava-me da importância de nós próprios sabermos descascar um pêssego, assim como de o plantar. E cuidar. É como aquela história, é mais importante ensinar a pescar, do que dar o peixe.
O meu avô ensinou-me entre outras coisas, a importância do trabalho, da humildade, e do aprender a fazer. De lutar sem passar por cima dos seres-humanos.
E vejam vocês lá bem. Que o António não completou a instrução primária. Não é magnífico?
Vocês que completaram a instrução primária, que fizeram o ensino básico e secundário. Foram para a universidade tirar Doutoramentos e isto e mais aquilo, e não aprenderam o respeito, a humildade, o civismo.
E depois com uma cara de pau, ainda exigem serem tratados por Senhores Doutores.
Doutores há nos hospitais, e vocês deviam era trabalhar no ferro velho. Tamanha é a lata com que andam para aí a existir dia após dia. Sim, existir. Porque isso meus amigos, não é viver. É limitarmo-nos a existir.
Como é que vocês podem mandar num país, quando não conhecem a realidade do país, quando não sentem o povo no seu conjunto como sendo cada cidadão um ser humano, e não um número. Isto é como tudo, um patrão não pode descer as escadas do escritório e ver o que se passa com os empregados só na altura de exigir horas extras. Quem não sabe trabalhar, não pode mandar. Esta por acaso não foi o meu avô que me ensinou, foi o filho dele.
Politiquice é diferente de Política, e vocês, meus senhores o que fazem são politiquices. Uma semi-política a roçar o ridículo. A roçar. Atenção, não toca. Porque o ridículo, quando usado com um certo charme, até tem muita graça. E os senhores não têm gracinha nenhuma, lamento.
Mas não lamento por vocês. Lamento pelos adolescentes que têm de trabalhar à noite porque os pais têm quarenta anos e já estão velhos para trabalhar, lamento pelos idosos, que ou têm dinheiro para a comida ou para a farmácia. Lamento por todas as famílias que não têm euros para pagar as contas da água, da luz, da mercearia. Lamento por todos os seres humanos que são boas pessoas e que têm que passar por dificuldades. E pela mãe que vi hoje a chorar porque não tinha como colocar comida para os três filhos que tem em casa. Lamento por todos as mães deste país. Lamento todos os meses descontar para vocês andarem a fazer sabe-se lá o quê. É que se eu descontasse para haver melhor educação, melhores hospitais, cantinas socias…. Era uma coisa e até sorria ao dar-vos os euros. Agora isto?
De coração, e sem qualquer tipo de sarcasmo, lamento pelos vossos avôs. Porque aqui bem dentro do meu miocárdio, acredito que vocês também tiveram um avô que descascava pêssegos como ninguém, e que vos transmitiu certos valores. Aqueles que não se vêm. Mas valem tudo.
Falemos de infância. E de recordações. E daquela vez que o meu avô disse para nunca me apaixonar por um político. Que era a pior raça de homens que existe. O que ele se esqueceu de dizer, é que mesmo que não esteja apaixonada por nenhum político, que tinha que sustentar não sei quantos deles, todos os meses. 



Cumprimentos aqui da vossa namorada,


 Estranha pessoa esta