sábado, novembro 24, 2007

Calçada da Ajuda 1998

Foi em fins de Outubro.
Vai quase para uma década.
Sim, vai para dez anos. Agora que penso nisso a sério. São dez anos.
Dez Outonos. Dez Primaveras. Uns quantos Verões. E sem dúvida alguma, dez Invernos.
Dez Invernos.
Lembro bem dos Invernos.
Eu gostava dos invernos nessa rua.
A calçada molhada.
A praça de rua.
O grito dos ciganos: Ó freguesa são só quinhentos marréis.
O resto de legumes no chão.
O frenesim matinal.
Os fins de tarde na tasca do senhor Chico.
Lembro bem dos tremoços.
Eram salgados.
Como a vida.
E a casa de ferragens do outro lado.
Deste lado era o terceiro andar.
A varanda era de ferro.
Ferro caído. Como o chão que tantas vezes pisamos.
Lembro bem do teu olhar.
Era claro. Grande.
As pestanas grossas.
É. Sem dúvida alguma que lembro bem desses Invernos.
No outro dia passei lá.
Nessa Rua.
A casa de ferragens já não existe.
Deve ter fechado com a tua morte.
Já passei lá tantas vezes e nunca olhava para esse lado da rua.
No outro dia parei.
Olhei.
E a casa de ferragens já não existe.
Lembro bem dela.
Do teu olhar atrás do balcão.
De me dizeres, solta o cabelo.
Tenho saudades tuas.
Vai para oito invernos que partiste.
Oito invernos.
Mas, os dois que sobraram ficam aqui.
Bem aqui.
Lembro bem dos Invernos.
Eu gostava dos invernos nessa rua.
A calçada molhada.
A praça de rua.
O nosso trampolim na paragem do eléctrico.
Os tremoços?
Os tremoços continuam salgados.
Como a vida!
O cabelo?
Nunca mais o prendi!


9 comentários:

Sandman of the Endless disse...

ah! saudade...
saudade dos tempos idos, não é mesmo, querida?
saudade, lembranças...
que seria de nós sem elas?
fazem parte de nós.
fazem ser quem somos.
fazem-nos vivos.
evocam sentimentos... dos tempos idos.
às vezes, dóem as lembranças,
mas não é uma dor doída.
é mais uma dor pelo que se foi,
pelo que poderia ser
e não foi.
lembrnças, doces lembranças...

um beijo daqui...
que ele pouse delicadamente
em tua face
e em teu coração!
e lhe faça corar
e lhe faça sorrir.

rui disse...

Olá Estranha Pessoa

Foi assim que te conheci, a brincar com as palavras!
Chamou-me logo a atenção e deixei-me cativar pela forma como escreves!
Gosto. Tem vida. E tem sal.
Solta, solta o cabelo e esse desejo de sentir a vida.

Grande abraço do
Senhor do mar

Melga do Porto disse...

Hoje almocei com os meus pais.
Fazia muito tempo que não acontecia.
Fazia muito tempo que não via a minha mãe alegremente, nos ouvir.
Fazia muito tempo que não via o meu pai deliciar-se com o prato de bacalhau que adora.
Fazia muito tempo em que não recuava ao bairro onde nasci.
Fazia tempo que já não me lembrava do Jorge com quem andei ao colo e hoje foi pai de gémeas.
Fazia tempo que tinha esquecido, quase perdido esse tempo.
Foi bom voltar.
Ficou uma vontade imensa de lá ter ficado.
Fazia tempo que não gostava assim tanto do “tempo”.
:)

£ou¢o Ðe £Î§ßoa disse...

Ofereço-te um sorriso, Estranha Pessoa Esta...

saudosista do futuro disse...

perco-me nos invernos
da tua escrita.
perco-me na tua memória.
sinto com a mesma inten
Cidade esses dois invernos.


______________
______________________

é a chuva e o sol frio,
lá fora. e dentro um
calor renovado a cada ano
e já mais velho.

__________________________

saudades estranhas.

Thiago Forrest Gump disse...

Cheiro de nostalgia!

lampâda mervelha disse...

"E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos E por vezes

encontramos de nés em poucos meses
o que anoite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes

ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos

E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se evolam tantos anos"


David Mourão-Ferreira.

Anónimo disse...

Porque a vida é assim.


Saudosa.



E os cabelos querem-se assim como a saudade. Desprendidos!



_______/


Beijo GD

Brain disse...

Pois... saudades.

Saudades de muitas e variadas coisas na vida.

Mas...
As saudades maiores,
São aquelas,
Que dissimuladas nos lugares,
Estão pregadas em nós,
Por não serem dos lugares,
Mas de quem verdadeiramente,
Os preenche.

E dessas,
Desse tipo de saudades,
Nunca conseguimos,
Saciar-nos.
Não é possível.
(pois não?)

Oito invernos.
Bem podiam ser um só.
É igual.
É sempre igual.

Mantém o cabelo.
Mantém a memória.

Eu mantenho-me por aqui,
Sempre,
Com um Beijo
E um Sorriso,
Para Ti!