segunda-feira, agosto 31, 2009

God is in the details


Há gestos meticulosos.
Que de tão minuciosos parecem obsessivos.
Como que um registar de momento.
Único.
Mas que de tão bonito, trememos a mão.
E o clicar sai assim, tremido.
Vacilado. Oscilado.
Como se o nosso tremer não fosse certo.
Como se o momento não fosse bonito.
Como se o próprio registo não ficasse exposto.
Fecho a cara e sinto.
Atenta.
De olhos fechados.
Porque há gestos que só são sentidos de olhos fechados.
Porque abertos parecem outra coisa.
Que talvez seja por não ser território.
De chegadas. Partidas. Caminhos.
Medos.
E. Credos.
Sobretudo credos.
Sem coros, harpas, flautas.
Violas e guitarras.
E lá fora o deserto.
Árido. Seco. Estéril.
De olhos abertos.
Repararam?
Tentem fechar os olhos.
Assim. Devagar.
Agora. Tremam.

Ando com frio.
E entre as pestanas.
O. Medo.

quinta-feira, agosto 27, 2009

ahhhhhhhh foda-se


Quietude?
Descanso?
Que se foda o sossego.
As estradas de alcatrão.
E os cães do quintal.
Que se foda o fácil.
O que dá jeito.
E o banal.
Que se fodam os casacos.
O que pesa.
Os ombros.
Que se fodam os vestidos.
As montras.
As pinturas.
Que se fodam os políticos.
As campanhas.
Patranhas.
Que se fodam quem não se fode.
Quem não se ri.
De si.
Desbocadamente.
Quietude?
Descanso?
Quero é tempero.
Sal.
Picante. Coentros. Alecrim.
Nos assados e afins.
Quero é provar provar provar
E beber água no fim
De tanto piripiri que se faz sentir.
Quietude?
Descanso?
Não sei fazer renda.
E a minha mesa não tem cadeiras.
Mas, que se foda!

quarta-feira, agosto 26, 2009

´Tese[s]


Há quem diga que todas as questões existencialistas são respondidas pela Metafísica.
Por uma certa simbiose intelectual… mas que me perdoem os filósofos, por vezes algo a puxar.. para, o digamos… arrogante.
É forte a palavra? Que seja.
Mas há teses que me esvaziam completamente o organismo.
Não é tanto pela tese.
É mais pelo organismo.
É que fico cá com uma azia a certos discursos fundamentalistas.
…..
Pensando melhor esta azia deve ser dos tremoços.
Faltava-lhes sal.

segunda-feira, agosto 24, 2009

Contorno[s] de 'inlucidez'


Contorno os meus dedos pela tela da memória.
Na eventualidade de numa qualquer madrugada,
aparecer a tua mão sob a minha cintura.
E assim esgueirar-me por todas as fragmentações do meu caos.
Alimenta-me.

sábado, agosto 22, 2009

Agonia[s]


E esta gente que anda de um lado para o outro.
Que se faz falar de assento.
E ás vezes até de acentos.
E esta gente que vê os outros.
Que se faz dizer pela boca.
E nunca pela garganta.
É como um teste de álcool.
Se sopramos pela boca, pouco ou nada acusa.
Agora se o ar vier directamente da profundeza da garganta.

Acusa tudo.
Tudo e mais alguma coisa que viesse.
Mas eles respiram pela boca.
E não se calam.
E esta gente que não se cala.
Que não se entende. Que não se entende.
Não vêm a destreza de uma Alma.
Que ‘insanamente’ tenta levar o dia.
E depois vem a noite.
E a madrugada.
Ai a madrugada essa.
Que nunca acaba.
E eles passam na rua.
São só sossegos.
Sossegos e mais sossegos.
E não se calam com o raio dos sossegos.
Sabem lá o que é agonia a percorrer as veias.
Cada centímetro de células. Chega ao núcleo e volta para trás.
E percorre todo o organismo outra vez.
Chega a entravar cada osso das mãos até estalar.
Não sabem? Então calem-se.
Calem-se porra!
E não me façam repetir.
Farta. Fartinha. Fartíssima de vos ouvir.
Com coerências. Equilíbrios. Desmentidos. Aliados de preconceitos.
Calem-se de uma vez.
Ou então enforquem-se na vossa lucidez.
Quero lá saber.
Enforquem-se de uma vez.
Agora não me fodam é o juízo.
Porque esse já o enforquei de vez.

quarta-feira, agosto 19, 2009

Oriente


São onze e tal da noite.
Está uma noite calma.
Silenciosa.
Tremendamente calada.
Muda.
Assim estou eu, muda.
Taciturna.
São onze e tal da noite.
Não se vê a Lua.
Não sei por ela anda.
Talvez ande por aí.
Por terras do Oriente.
Dizem que Oriente é sinónimo de início.
De Aurora.
De Alvorada.
De pimenta. De especiarias.
Condimento.
De tempero.
De puro. Tempero.
Algo apaladado.
Não no sentido extremo da palavra.
Mas sim, das sílabas.
Como que o paladar de cada letra. De cada som.
Cheiro. Aroma.
Tomasse configuração.
Como se fosse Terra.
Molhada.
É quase como que um pisar de relva húmida.
Mas descalça.
Sente-se cada gota do fólio.
Como se de suor a escorrer pelo pescoço se tratasse.
É um género de canela.
Em estado bruto.
São onze e tal da noite.
Já quase meia noite.
Está uma noite calma.
Silenciosa.
Tremendamente calada.
Muda.
Falta-me o gemido.

domingo, agosto 16, 2009

Ginja


Esta ausência da tua pele.
Arrasa-me com os nervos.
Anseio a tua saliva.
Pelas glândulas de todas as minhas entranhas.
É.
Existem encontros saborosos.
Depois existem os outros.
Completamente apetitosos.
É como beber ginja.
Podemos saboreá-la num copo de plástico.
Ou, por outra.
Num delicioso copo de chocolate.
No fim até se lambe os dedos.
A gana.
Com a língua toda.
Irreversivelmente.
Eriças-me.

sábado, agosto 15, 2009

Fome


Depois de saborear um pensamento.
O sentimento tornar-se Asma.
A realidade envolvente demasiado pequena.
E o desejo insaciável.
Tu falas em azul claro.
Eu murmuro cores daltónicas.
Como aquele nascer do sol.
Vermelho forte a estibordo.
Neblina a bombordo.
Depois de saborear um pensamento.
O sentimento torna-se verdadeiramente asmático.
E a fome incontrolavelmente sequiosa.
Escuta. Diz o silêncio.
É o dia a chegar.

terça-feira, agosto 11, 2009

Solidó


Havia semanas que era ao Domingo.
E outras que era ao Sábado.
Eu gostava mais ao Sábado.
Sempre me pareceu que o Sábado é maior que o Domingo.
O Domingo faz-me sentir o fim de algo.
Mas. Sim.
Gostava mais ao sábado.
Era no meio da calçada.
No Bairro da Ajuda. Como quem sobe do lado direito.
O passeio era de uma calçada mais escura.
Endurecida.
Gasta.
Pelas décadas.
Ficava na esquina a ver os eléctricos.
O som dos eléctricos sempre me acalmou.
E ficava ali de olhos fechados. Imaginava outros tempos. Outros olhares.
Os coches a golpe de cavalo.
Calçada acima. Calçada abaixo.
E de vez a vez vinha aquele cheiro do Tejo do princípio da rua.
E dos pinheiros lá de cima de Monsanto.
Eram pinheiros mansos. Como manso era o meu sentir de esquina.
Havia uma qualquer brisa histórica naquela rua de calçada escura.
Trazia sons, cheiros, passos, sorrisos, lágrimas de séculos.
Às vezes na esquina tocavam uma concertina.
E cantavam o solidó.
Um dia destes gostava de cantar o solidó.
Disso. E de rimar certos verbos.
Porque os adjectivos esses são como as esquinas.
E nunca como os Domingos.
E de vez a vez vinha aquele cheiro do Tejo.
E dos pinheiros lá de cima de Monsanto.
Eram pinheiros mansos. Como manso nunca mais foi o meu sentir.


[Estranha pessoa esta.
Agora, quase seis da manhã. Cruzamento do Charco.
Porque sempre me apeteceu escrever de madrugada nestes semáforos.
Foi hoje. ]

quinta-feira, agosto 06, 2009

Bico da Vela



Quando choro, a lágrima desce pelas curvas do meu peito.
Como que um latejar de veias. Da minha face na tua.
Como aquela vez em que as pedras tomaram um sentido.
O Nosso Sentido.
E até a Penha do Meio-Dia se encaixou no Bico da Vela.

domingo, agosto 02, 2009

Nevoeiro



Há realidades incontornáveis.
E outras, há incontroláveis.
Depois…
Depois existem aquelas de sufoco.
Que são incontroláveis e irremediavelmente incontornáveis.
Ao mesmo tempo.
Como que uma tempestade. Que vem tudo.
É vento. Trovoada. Chuva. E que chuva.
Como as marés vivas.
A areia não pode as contornar, e muito menos as controlar.
Vão lá, desgastam as rochas, lapidam o areal.
E passado, umas madrugadas vão embora.
Como as luas.
Sem quarto crescente.
E ficam os pescadores de mãos vazias.
Porque as marés valem só por si.
E as gotas da chuva que batem no mar ficam ali.
Gravadas.
Numa qualquer badalada do sino da aldeia.
São cinco horas.
Ouviste?
Está nevoeiro.
E eu choro.